Escrevo-vos de casa, pois também estou em teletrabalho.
Tenho muitas pessoas amigas que neste momento estão em layoff e, outras que, porque são empreendedoras e começaram negócios próprios, estão neste momento a ver se o dinheiro que têm chega para as despesas que existem.
Nesta altura assombram-nos imensos sentimentos, emoções, muitas vezes opostos. Há alturas do dia em que nos sentimos otimistas e confiantes, e outras em que nos desaparece o sono e começam as dores de tensão acumulada no pescoço. Assim estou eu… A tentar as várias estratégias que conheço para me manter firme e não me entregar a pensamentos derrotistas e tristes e conseguir motivar a minha família e dizer, com total confiança, que isto vai passar. Afinal, é esse o papel das mães, certo?
A verdade é que acredito que vá demorar até termos a nossa vida, tal e qual a conhecíamos… penso muitas vezes que nunca mais a teremos, tal e qual como era, mas depois desaparece logo este pensamento porque sei que somos seres de hábitos e de adaptação. De repente, este é o nosso “novo normal” e vai custar-nos voltar às nossas rotinas que tanto nos fazem falta agora…
Creio que a sociedade e até nós próprios, por certo, reequilibrar-nos-emos, talvez num outro ponto de equilíbrio, que não será o anterior, mas muito perto disso.
Nesta nossa “quarentena “de repente, tudo o que queríamos fazer, mas não havia meio de o colocarmos como prioritário, passa a ser das primeiras coisas a fazer no nosso dia a dia. Meditar, cozinhar para a família e até o exercício (que era sempre difícil começarmos) …de repente faz sentido saborear, de repente mexem connosco sentimentos avassaladores de empatia e de compaixão. De repente, ainda que à distância, reforçam-se relacionamentos e a entreajuda. Estranho não? Foi preciso estarmos afastados para termos tempo e vontade de estarmos cada vez mais juntos. O ser humano é muito esquisito. Precisa de não ter, para dar valor, precisa de estar inibido para ter vontade…
Estes somos nós.
Saborear…viver o aqui e o agora. Um dia de cada vez. Por esta altura, passamos os dias a dizer isto. E porquê? Porque não sabemos o que de facto vai acontecer. Ninguém sabe. Neste momento a nossa saúde pode estar em risco, tememos pela nossa família, pelos nossos amigos, confrontamo-nos com a insegurança do nosso emprego…Não sabemos.
E estamos TODOS assim. E é isso que nos une. A empatia nunca fez tanto sentido nas nossas cabeças. Conseguimos pormo-nos no lugar do outro facilmente, porque estamos todos na mesma situação, na mesma “batalha” …
Temos todos os mesmos receios…nomeadamente a incerteza, esta malfadada incerteza do que aí vem.
Então, como dizem os sábios: se não consegues controlar o que te pode acontecer, aceita. Deixa-te ir. E no entretanto, desfruta do que a vida te dá agora: seja um bom banho sem hora para sair, uma refeição que demorou a ser feita no forno, um bom aconchego no sofá, um bom livro, uma actividade com as crianças no final do dia, uma reunião com um colega sem pressas, um café à varanda, um zoom com um bom copo de vinho, uma mesa bonita com as loiças do serviço “especial”…
E quando o fizerem, tentem saborear MESMO. Sair da experiência e analisá-la, observá-la. O sabor que retiramos das coisas intensifica e prolonga as emoções positivas que nos surgem quando fazemos o que gostamos.
Um bom exercício é escolher uma destas por dia para o “saborear” ser mesmo especial.
Para esse “saborear diário” deixo algumas dicas, sciencebased as always😉:
– partilhar essa experiência com alguém da família/amigos;
– pensar na nossa sorte ao podermos desfrutar de um momento assim, ainda que nesta altura conturbada;
– tirar uma fotografia, se for possível;
– à noite, quando nos formos deitar, escrever um “diário de gratidão” onde escrevemos três momentos pelos quais nos sentimos gratos nesse dia. Podem ser momentos simples como este momento que saboreámos aos quais acrescentamos até ao máximo de três;
– neste momento em que escrevemos e nos voltamos para dormir, reservar uns minutinhos para pensar neles, revivendo-os nas nossas cabeças.
Isto, por estranho que pareça, ajuda a saborearmos, a aumentarmos a carga de emoções positivas que é tão necessária nesta altura. Porque não tentar?
PS: não se sinta estranha(o) se não sentir vontade de fazer estas coisas… É natural não sentirmos todos a mesma coisa ao mesmo tempo. Mas a ciência também nos diz que às vezes ajuda “forçar”. Depois disso, a vontade aparece. É químico. Estes momentos prazerosos libertam dopamina que é uma neuro hormona libertada pelo nosso cérebro e que tem um papel muito importante na regulação da boa disposição e na nossa energia.
Até breve, fiquem bem.
by Marta Branquinho Garcia
2 comentários
Claudia Columbano · Abril 13, 2020 às 15:17
Pois é Marta, nunca mais seremos os mesmos certamente… o homem existe para viver em sociedade e agora ter de viver em isolamento social é completamente paradoxal! Obrigada pelas dicas para o “saborear diário” que tão importantes são nestes dias, como nos dias de excesso de trabalho e stress a que muitos estariam habituados.
Tenhamos todos a sabedoria e capacidade de neste processo de transformação de nós mesmos, encontremos o caminho para uma vida mais equilibrada, justa e sustentável.
Marta Branquinho Garcia · Abril 13, 2020 às 16:02
Obrigada querida Cláudia
Que tudo corra pelo melhor e passe isto tudo depressa para todos!